HABITATI por Tati Regis (Colunista FILMICCA)
A América Latina tem uma forma muito particular de contar histórias, sejam elas de que gênero for, dos dramas realistas às fantasias insólitas, é colocada em suas tramas muita realidade. Talvez isso aconteça muito pela vivência de quem esteja contando tais histórias, sejam elas passadas em periferias ou em grandes comunidades e casarões muy rycos. Não me recordo agora onde ouvi isso, talvez em alguma música dos Racionais, mas é algo assim: “Periferia é periferia é qualquer canto do mundo”. E é. Seja aqui no Brasil, no Peru, na França, nos EUA ou na Inglaterra, o que muda um pouco é a arquitetura e algumas condições, mas que dá pra reconhecer, isso dá sim.
O filme de hoje é sobre uma família periférica quebrada e desconectada. Mais especificamente sobre Rosa, uma mulher dura, que trabalha como policial. Mas sua dureza não vem da profissão, não. Foram as decepções e derrotas ao longo da vida que fizeram de Rosa uma mulher de pedra que vê alegria em quase nada. Além de tudo, Rosa bebe álcool com frequência e é viciada em jogo, naqueles joguinhos de ganhar moedas, sabe? De início tem uma cena dela ganhando um monte delas. Só que é aquilo, né, sorte no jogo, azar no amor. O amor aqui eu enquadro o bem querer familiar mesmo, ela divide morada com o neto e com a filha Sheyla, mãe jovem e solo, cuja convivência com Rosa não é das mais saudáveis. Toda grana que sobra e não deve ser muito, Rosa guarda num saquinho enrolado debaixo do colchão. Sheyla não tem emprego e vive pedindo dinheiro a mãe com a desculpa que é pra fralda do menino. Num dia, as duas discutem muito feio, com direito a tapa na cara e Sheyla sai de casa deixando filho com a avó.
Eu não conheço o cinema de Jonatan Relayze, diretor de Rosa Chumbe, mas sua sensibilidade e forma de filmar mostrando uma Lima de forma bem crua e seu véus, com toda sua multiculturalidade e problemáticas e aí reafirmo aqui o que falei lá no início sobre periferias, principalmente aqui em América Latina, são muito parecidas. A gente vê esse passeio pela capital peruana e é mesmo que tá vendo Brasil. As mesmas urgências, as peças raras, os vícios e problemas, mas também vemos beleza. Beleza na solidariedade, no amor, na fé e na religião. É o amor ao neto que quebra o coração de gelo de Rosa quando ela se vê só com a criança tendo agora que ser sua fortaleza. Rosa passa a ser mais atenciosa e amável, mas uma noite ela descobre que a filha lhe roubou e aí acontece algo dilacerador. Fica a pergunta, será que o amor e a fé de Rosa irão fazer milagre? Ao mesmo tempo em que vemos o coração de pedra de Rosa dilacerado, vemos Sheila enfrentando talvez o maior desafio de sua vida, principalmente agora que está só. Ela se
descobre grávida e tem que tomar uma decisão. Uma família, duas mulheres, vários problemas e a redenção.
Liliana Trujillo é a responsável por dar vida a Rosa. Uma performance cheia de silêncios que nos fala mais que se tivesse enchido de diálogos, recurso muito utilizado nos filmes peruanos e que o próprio diretor diz não gostar. O foco em suas expressões, olhares e trejeitos vão construindo essa personagem e digo que é fascinante fazer a leitura dela a
cada cena, a cada desafio em tela. Não à toa ela foi super elogiada e até premiada por essa personagem memorável.
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Artigo Original: https://letterboxd.com/filmicca/story/rosa-chumbe-de-jonatan-relayze-por-tati-regis/